quinta-feira, 22 de abril de 2010

Texto escrito em 2005. Engraçado como mudam os personagens e os planos de fundo, mas a história parece sempre a mesma.

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Sobre a inutilidade dos sonhos

No auge de suas idades mais floridas, ela sonhara com tanta coisa... seus devaneios lhe pareciam sólidos, ela já se via realizando tudo aquilo que havia mentalizado. Aos poucos, foi vendo o mundo mostrar sua face mais escura, começou a perceber que seus braços eram pequenos demais para alcançar tudo aquilo que queria.
Seus sonhos foram sendo sufocados por aquela cadeira dura em que repousava sua bunda o dia inteiro.
- Repousar? Quem disse que ela estava cansada?
Com o tempo foi ficando... Cansa! Cansa querer continuar falando de poesia e descobrir que o tempo para a poesia já acabou; agora é hora de falar de gastrina, enterogastrina, coleicistonina... que raios de nomes complicados são esses para poder se fabricar MERDA! Merda, merda, merda! Para que saber desses hormônios de merda, se dentro dela outros hormônios afloram e a inebriam? E agora ela está preocupada por ter falado tanta merda. Repetição de palavras não é bom para a estética e também não é de bom tom falar merda. Deveria ter colocado entre aspas. Aspas dão licença poética, licença formal e quadriculada... "a libertação comprimida das aspas"... ainda escrevo sobre isso.
E agora percebo que já mudei o foco narrativo, mudei de assunto... e já que mudei mesmo, quero agora falar sobre flores e jardins, dias de sol e passarinhos cantando. É melhor falar de coisas bonitas...
...
... mas o problema é que já me enfiaram cabeça a dentro que coisas bonitas não dão 'ibope'. Já não sei mais falar dessas coisinhas (que sequer vivo). Só sei falar daquilo que sinto. Só sei escrever sobre angústia, porque a alegria não precisa ser escrita, ela fala por si, foi feita para ser vivida, e não comentada, escrita e milimetrada. E talvez essa idéia de felicidade, alegria, angústia sejam todos conceitos impostos por essa sociedade capitalista, hipócrita, cruel e blá, blá, blá ... lá vêm esses discursos pseudo-engajados, pseudo-acreditados, pseudo-vivenciados... que porre! Quem vai querer saber dessas ideologias, sobre a dialética da ideologia, sobre saber se me engano ou se sou enganada... qual é a diferença? Este é apenas mais um mero detalhe da alienação, da não-alienação ou do pagamento do analista.

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